quinta-feira, 19 de abril de 2012

Danuza Leão

Olá! Como já comentei aqui, adoro os livros e as colunas que Danuza Leão escreve. Sou fã dela! Aí vai um texto que ela escreveu para a revista Cláudia. Bjão





Danuza Leão observa a simplicidade de um casal feliz





Era um fim de tarde entre o Natal e o Ano Novo e caía uma chuva fininha que não dava trégua, como acontece no inverno de Paris. O Boulevard St. Germain estava todo iluminado e as vitrines eram uma verdadeira festa. Um casalzinho jovem parou diante de uma delas para olhar.
Era evidente que eles vinham de uma cidade pequena para passar o fim de ano em Paris. Todo mundo andava rápido para não se molhar, mas eles nem ligavam, tão embevecidos estavam com o que viam. Detalhe: a loja era de roupas e acessórios e na vitrine não havia o preço de nada.
Depois de conversarem muito tempo, baixinho, eles enfim entraram; entraram, veio a vendedora, a moça pediu para ver uma das echarpes e procurou um espelho para observar como ficava.
A vendedora foi junto e houve uma longa sessão em que foram mostradas as diversas formas de usar uma echarpe: fazendo duas voltas em torno do pescoço e deixando as pontas nas costas; dando um nó do lado e jogando uma ponta para a frente e a outra para trás; sobre a cabeça, cruzando na parte da frente do pescoço; enrolada na alça da bolsa; por dentro do casaco; e as mil outras que todas as mulheres já nascem sabendo – como ela. Mas eles deveriam estar de acordo, os dois, para que a compra fosse feita. Estava claro que eram casados fazia pouco tempo e se amavam.
Detalhe: em países ricos, como a França, a compra de uma echarpe é uma coisa banal e rápida – e aquela nem custava muito caro –, mas para o jovem casal, percebia-se, era uma transação importante. E uma mulher que ama não faz uma compra dessas sem saber a opinião do marido. A vendedora foi atender outro tipo de cliente, aquela que em um minuto decide se compra ou não; se sim, tira o cartão de crédito, paga e sai. Mas o casal tinha todo o tempo do mundo e trocava ideias sobre se devia ou não levar a echarpe. Afinal, estavam em Paris e provavelmente aquele seria o presente de viagem dele para ela.
A vendedora percebeu que devia deixá-los em paz e eles olharam a loja inteira – sempre com a echarpe na mão. Ela voltou para a frente do espelho – com ele ao lado –, fez mais algumas experiências de como poderia usá-la, os dois se olharam e tomaram a decisão: iam comprar.
Procuraram a vendedora e ele – ele – disse que haviam resolvido. A echarpe foi embrulhada em papel de seda e colocada numa sacola de papel grosso, e não na costumeira sacola vermelha de tecido com o logotipo da loja, para ser protegida da chuva. A conta foi paga com cartão, e na hora de ir embora a moça perguntou baixinho à vendedora se não poderia botar dentro da sacola de papel a sacola de algodão vermelho para levar de recordação – o que foi feito.
Eles saíram debaixo da chuva, que caía um pouco mais forte, de mãos dadas, mais felizes do que se tivessem comprado o mais valioso diamante da mais luxuosa joalheria da cidade, e quem acompanhou tudo teve um pequeno aperto no coração e uma inexplicável e rápida vontade de chorar. Gente simples, ingênua e feliz às vezes provoca mesmo essas reações bobas.


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